sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Primeiras impressões

  Passaram-se duas semanas desde que comecei a trabalhar em um posto de saúde na cidade de Maringá, lido com burocracia, seres humanos necessitados e histórias, muitas histórias, algumas coisas logo se tornam evidentes neste pequeno lapso de tempo e outras se delinearão com mais tempo.
  O mais óbvio é o perfil econômico das pessoas que procuram a unidade de saúde básica gratuita, aquelas que têm poucos recursos e dependem exclusivamente do sistema público de saúde, embora apareçam, de vez em quando, pessoas com receitas particulares tentando conseguir medicamentos.
  Percebi que o coração viverá apertado, vendo situações de extrema urgência e não podendo fazer nada além de encaminhar a pessoa a um especialista ou para um exame que levará meses para ser realizado, a burocracia que era para ser tão eficiente atrapalha muito o bom andamento do sistema de saúde, uma palavra escrita errada ou um pequeno detalhe esquecido num papel pode custar muito caro a quem tanto precisa, sente-se o peso do que realmente é responsabilidade, algo que pode custar a saúde de alguém, embora para quem está habituado ao que se passa lá pareça tudo mais simples, não que eles não se importem, mas parece que já viram o suficiente para seguir em frente com tranquilidade.
  No meio de tudo que ocorre no posto de saúde, nestes primeiros dias, o que me chamou a atenção foi a grande quantidade de jovens grávidas dando entrada no pré-natal, fazendo consultas com o ginecologista por conta da gravidez ou acompanhamento pós-parto, grande quantidade de crianças levando suas crianças recém nascidas para acompanhamento com o pediatra, sem contar os exames de gravidez que pedem para que se veja no sistema o resultado, obviamente aflitas, chegam a comemorar quando o resultado é negativo.
  As mais diversas estatísticas negativas parecem se concentrar no mesmo lugar, casos que dão a noção da realidade e o choque com o que é observado, as estatísticas vistas na realidade e não numa planilha são muito mais preocupantes e apavorantes, pois envolvem seres humanos e não números, muitos sentimentos se misturam, mas a indignação e a revolta com a sociedade trágica que construímos são os mais presentes. 
  Em suma, muitas experiências vêm por aí, pelo jeito só confirmarão e darão maior noção do que é a podridão da sociedade que construímos, que não consegue atender os mais necessitados, que trava a possibilidade de cura de alguém por conta de uma vírgula fora do lugar, porque sai mais caro ou a licitação não saiu a pessoa terá que sofrer, não se atende alguém porque as vagas são limitadas, pessoas madrugam para conseguir uma simples consulta, enfim, são muitos casos, muitas histórias preocupantes onde as chances de um final feliz são pequenas ou ele só virá depois de um longo processo.
  

Um comentário:

  1. Pois é, muitas vezes, o longo processo tem que ser judicial... Imagina que eu cuido, onde trabalho, das liminares em processos de medicamentos - isto é, quando as pessoas processam o governo (Município ou Estado) para conseguir o fornecimento de medicamentos caros. Há casos verdadeiramente horríveis. E é, na verdade, terrível perceber que essas pessoas têm que entrar no judiciário para conseguir que a lei lhes garante... quer dizer, a Vara em que eu trabalho, ela serve basicamente pra obrigar o Poder Público a fazer aquilo que eles já deviam estar fazendo espontaneamente. Por esta parte, é desolador.

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